domingo, novembro 25, 2007

ZERO À DIREITA

Dizia o escritor espanhol Manuel Vasquez Montalbán que «no final a batalha será entre ex-comunistas e comunistas». Não andará longe da verdade se olharmos um espaço ideológico global dividido entre uma espécie de leninistas de direita, os neo-conservadores, e a esquerda liberal ou reformista, os socialistas de terceira via. Mas as diferenças entre a direita e a esquerda, na Região, são perceptíveis?
Entre nós, os partidos nasceram todos ontem, e 30 anos são um património demasiado recente para fazer história, definir tradições ou deixar valores de referência. Sabido é, no entanto, que perante a proibição constitucional de partidos regionais apenas os dois maiores partidos nacionais deram condições aos seus sucedâneos regionais (PSD/A e PS/A) para prosseguirem um projecto político de cunho autonómico (o PDA foi um fogo fátuo). Tradicionalmente qualificado de direita, mais por conservadorismo da base de apoio do que por genealogia programática, o PSD/A, foi poder durante 20 anos encontrando na igreja alguns dos princípios de que se necessitava e preenchendo a restante vida comunitária com um carisma vagamente idólatra de adoração ao líder (João Bosco Mota Amaral) e com a gestão diária de interesses através do exercício do poder. Fora isso, conseguiu ultrapassar o próprio socialismo democrático pela esquerda com o impressivo dirigismo económico-financeiro presente na subsidiação directa ao investimento e na inesgotável política de obras públicas (tudo a coberto do conceito de «desenvolvimento harmónico»). Com a derrota de 1996 o PSD/A perde, necessariamente, a parte do eleitorado que se lhe ligava por via do poder (ao centro, o eleitorado urbano em crescimento acelerado na Região nos últimos 15 anos é uma massa cinzenta volátil que olha a carteira; à direita, o empresariado procura quem lhe garanta condições de investimento). Restou-lhe o eleitorado conservador não qualificado com representatividade directa nas freguesias rurais, rapidamente conquistado pelo PS/A por mor da segurança social (que paga as pensões) e da solidariedade social que canaliza os fundos públicos, estrategicamente, para a rede público-privada de extensão regional. Juntou-se a isso uma ala dirigente que, no plano das ideias e das pessoas, com o exercício do poder, foi enfraquecendo, pelo que a ténue capacidade de atracção de militantes e de convencimento duradouro também lhes está directamente relacionada. Os programas do PSD/A foram confiados a “funcionários” aos quais também era pedido que conduzissem o combate com o adversário político, ou com o aliado de momento. Consequentemente, os debates de fundo deixaram de ser incisivos fora do círculos dos detentores de mandatos e deixaram de ter qualquer repercussão externa. Um vazio que o apoio de «especialistas da sociedade civil» serviu apenas para mascarar, sobretudo perante a comunicação social. Parece ser, justamente, aqui que reside a crise dos grandes partidos e em especial a do PSD/A. Nem as correntes mais autonomistas, ou conservadoras tradicionais (defendem o trabalho e a família), ou liberais (que nunca se reviram no ideário social-democrata açoriano, mas que defendem a livre concorrência, o empreendedorismo, a responsabilidade individual, o mérito), nem mesmo os aliados dos sindicatos (relembre-se a ligação dos TSD açorianos ao sindicalismo da UGT), procuram um diálogo junto daquele partido. O único esforço visível para alterar o paradigma social-democrata açoriano surge na sua base autárquica que reinventa a subsidiação directa e as obras públicas, através do populismo pragmático, para a prossecução imediata do bem-estar do cidadão: «Ponta Delgada, um concelho feliz!». Eis-nos chegados ao actual PSD/A. Um partido com mais de 9 mil militantes inscritos, mas em que apenas 2800 se disponibilizam a votar na escolha do líder, com um programa político onde continua evidente a exigência de regulação pública da economia, a crença em serviços públicos fortes e correctamente financiados, a defesa do estado social europeu, o ecológico por via do energético e a modernização e descentralização administrativa, ou seja, nada que se diferencie da esquerda reformista no poder. Por isso a Costa Neves apenas tem restado dizer, como tem feito, que fará melhor que o PS/A. Não é suficiente nem convence, é a diferença entre alternativa e alternância. (Continua)

Sé, 20 de Novembro de 2007

domingo, novembro 11, 2007

TORNA, NÃO TORNA…

…temos “fandango” à conta da Universidade dos Açores (UA). E, dramaticamente, o compasso é, sempre, o mesmo. Agora, o anúncio de que a UA seria objecto de saneamento financeiro, num prazo de 3 anos, e as declarações do Ministro da Ciência e Ensino Superior lembrando que a sociedade tem que ter retorno adequado ao esforço financeiro que está a fazer na nossa Universidade. Problemático? Pelo contrário! Só os espíritos mais turvados não poderão subscrever estas orientações, e se assim o fazem é porque se continuam a demitir do essencial. E o essencial, aqui, é, inquestionavelmente, reflectir sobre os modelos de desenvolvimento da UA. Queremos, ou não, uma organização com projecto estratégico e muita gestão, que passe a satisfazer a sociedade açoriana nos moldes que esta lho exige e com os recursos que lhe afecta? Se a própria UA já apresenta unidades orgânicas exemplares, dentro de uma incaucionável Tripolaridade, ou Multipolaridade, como lhe chama Avelino Menezes, fundamental será gerar, interna e externamente, condições estratégicas para o desenvolvimento, abandonando projectos ou vontades pessoais.
Nesta matéria, convém beber um pouco de História para que se encontrem algumas justificações para o presente. O Decreto-Lei n.º 5/76, de 9 de Janeiro, determinou a criação do Instituto Universitário dos Açores, tendo por fim “promover no arquipélago o ensino de nível superior, a investigação científica e tarefas de extensão cultural e de prestação de serviços à comunidade”. Quando o Decreto-Lei n.º 252/80,de 25 de Julho, transformou o Instituto Universitário dos Açores em Universidade, transferindo para o Governo dos Açores “poderes próprios de tutela e superintendência”, fê-lo considerando que “o carácter de insularidade da Região implica soluções particulares que o ajustem às realidades geográficas, económicas e sociais do arquipélago, no quadro do seu regime político-administrativo”. Finalmente, é público que a dupla tutela foi retirada à UA, no início dos anos 90, por motivos de indisponibilidade financeira da Região.
O rememoriar dos pressupostos que justificaram aquelas decisões históricas não devem cair em vão quando, 30 anos passados, algumas vozes questionam a tripolaridade e outras clamam pelo regresso da tutela regional partilhada, ou exclusiva, como panaceia para todos os males. Ainda que esta ideia possa seduzir os espíritos mais autonómicos (e dela não me auto-excluo) há que verificar se os fundamentos que sustentam a actual tutela exclusiva da administração central, já deixaram de se fazer sentir. Essa análise implica: primeiro, que a Região (sociedade civil e partidos políticos) defina o que quer para a UA, e da UA (como já se escreveu “os açorianos insistem no «dois em um»: desejam uma Universidade sabendo que precisam de um Instituto Técnico”); segundo, que a UA defina a médio/longo prazo, conjuntamente com os órgãos de governo próprio (sublinho Assembleia Legislativa e Governo Regional), o que quer ser, para onde quer ir e, como o quer fazer; terceiro, que se determine se o Estado já cumpriu o seu dever de solidariedade para com esta parcela do território nacional em matéria de infra-estruturas de ensino superior. É que a tutela pela Região não pode ser querida como mero modelo de garantia financeira para as responsabilidades alijadas por outros. Corre-se o risco, perante tamanhas indefinições, que todo o esforço financeiro que hoje está a ser exigido à administração central e regional mais não seja que o cumprimento de promessas extemporâneas e, estrategicamente, desajustadas. Não é de excluir que, a médio prazo, a administração central lave as mãos, dizendo que honrou o que lhe foi pedido, continuando a UA a não estar dotada das infra-estruturas essenciais aos desafios que os Açores do século XXI lhe estão, legitimamente, a exigir: a utilidade prática de conhecimentos, no que respeita a estudos sobre as pescas, agricultura, turismo, novas tecnologias, etc... Por exemplo, a Escola Superior de Enfermagem de Angra do Heroísmo quer transformar-se numa Escola Superior de Saúde, deixando de formar apenas enfermeiros e leccionando outras especialidades, de acordo com as necessidades da Região. Óptimo! Mas, em Angra do Heroísmo, o pólo da UA, em construção, e o novo Hospital, em projecto, foram pensados neste pressuposto? E se a Região quiser avançar para uma tão necessitada Escola Superior de Turismo e Hotelaria, algum dos actuais pólos terá essa capacidade? E um eventual Politécnico terá sustentabilidade numa raiz multipolar? Continuam a ser demasiadas perguntas que, com drama ou sem drama, condicionam a “nossa” Universidade dos Açores a um futuro, frustrantemente, incerto!

Sé, 6 de Novembro de 2007