UMA ÓPERA BUFA
A mistificação
mediática com que o PSD/Açores tem tratado uma matéria fundamental para o nosso
futuro, como os transportes aéreos e marítimos, na impossibilidade pública de
uma justa qualificação política, remete-me para o campo das artes cénicas.
Berta Cabral é líder do PSD/Açores desde Janeiro de 2009. No seu longuíssimo
currículo, de 30 anos em funções políticas, destacam-se, para o que aqui nos
releva, o cargo de Directora Regional dos Transportes, de Presidente do
Conselho de Administração da SATA e de Secretária Regional das Finanças. Do
período, em que teve responsabilidades directas, ou que pôde influir
decisivamente, na evolução do sector, o que nos ficou dos transportes marítimos
foi a sua extinção, e dos transportes aéreos a sua pré-insolvência, temperada,
anualmente, com aumentos das tarifas na ordem dos 10%.
Entre longos
silêncios, como que à espera de uma luz do Divino, o PSD/Açores sob a sua
liderança mascara o pesado legado e decide, num errático argumento, cavalgar
todos os descontentamentos e demagogias da praça pública, chegando ao cúmulo
de, no espaço de poucos meses, fazer juras a Deus e ao Diabo.
Começaram nas
Low Cost. A 6 de Janeiro de 2010, afirmava Berta Cabral “É preciso deixar que
as ilhas que têm condições para receber companhias low-cost as possam receber e
potenciar através disso o turismo dessas ilhas”.
Já a 17 Outubro
2011, questionada sobre se o seu modelo aponta para a manutenção das cinco
portas de entrada tergiversa “Essa questão tem de ser bem estudada no seu
conjunto, não vou estar aqui a dar opiniões avulsas sobre cinco, sobre três
sobre quatro. Pode fazer todo o sentido e até pode ser que se façam opções
diferentes.” Inacreditável!
Depois nunca
mais parou! A 13 de Janeiro do corrente, afirma ter proposto ao presidente da
Comissão Europeia, Durão Barroso, a criação de um programa POSEI para os
transportes que permita reduzir o preço das passagens aéreas “uma ideia
inovadora”, afirmou Berta Cabral, como se não fosse público que o Governo dos
Açores vem trabalhando formal e politicamente a mesma ideia, desde 2010, junto
das RUP e das instituições europeias.
A 15 de
Fevereiro, ajusta a mira e “temos de acertar as nossas estratégias em função
das novas realidades e mais do que low-cost, os Açores precisam de tarifas mais
baratas” mas, reafirmando a necessidade do POSEI para os transportes, já diz
que “vai ser um caminho longo e duro”.
A 13 de Março,
na apresentação da candidatura já “é uma prioridade absoluta um modelo
agilizado que defenda os passageiros, residentes e não residentes, por via da
fixação de uma tarifa de teto máximo”.
A 15 de Abril, em
pleno discurso de encerramento do congresso partidário, garante que “1% do
orçamento regional será alocado ao abaixamento das passagens”. 12Milhões a
menos para o Governo da República de Passos Coelho!
Mas, três dias
depois, a 18 de Abril, quando perguntada se realmente pode concretizar essa
promessa, já tem menos certezas “isso vai decorrer das negociações e da
possibilidade dos fundos disponíveis para esse efeito. Eu neste momento
preferiria não estar a apontar um número porque se apontar agora pode ser muito
ou pode ser pouco”.
A 16 de Maio,
afirma peremptoriamente que a proposta do Governo Regional para alterar as
obrigações de serviço público nas ligações aéreas entre os Açores e o
continente, com tarifas a menos 40%, “não merece confiança e engana os
açorianos”.
A 21 de Junho, o
POSEI Transportes volta a ser “um desígnio” e a 29 Junho é "urgente criar
condições do ponto de vista legal para permitir a operação de aviões
cargueiros”, como se a proposta do Governo dos Açores entregue em Lisboa não
resolvesse essa questão.
A 10 de Julho,
“os aeroportos dos Açores têm de fazer parte do pacote de privatização” da ANA,
que “deve garantir os seus custos de funcionamento e de investimento”, mas um
ano antes, a 8 de Julho de 2011, o Grupo Parlamentar do PSD/A votou contra uma
Resolução com o mesmo teor, quiçá porque, a 9 de Maio desse ano, a sua líder se
havia comprometido “a aprofundar as competências das regiões autónomas, por
exemplo, na gestão dos aeroportos na sequência da privatização da ANA”.
Como se tal não
bastasse, no passado 11 de Julho, surge o clímax desta comédia quando, no
âmbito das conferências promovidas pelos sociais-democratas, o ex-Presidente do
Conselho de Administração da SATA, de uma penada, desmontou em directo e ao
vivo todo o argumentário que a líder do PSD/Açores andou a encenar. Pior era
impossível!
Na verdade, o
modelo apresentado não só se assemelha como assenta em todos os pressupostos
que o Governo dos Açores vem defendendo desde Agosto do ano passado junto do
Governo da República: 1) não onerar mais o erário público (Berta Cabral defende
o desvio de 12Milhões do orçamento regional); 2) flexibilizar o modelo das OSP contra
o fantasma da low cost (Berta Cabral já defendeu as low cost); 3) criar uma
tarifa especial para residente, com tecto máximo e posterior entrega do
subsídio ao passageiro, numa redução em cerca de 40% do valor actual
(exactamente o proposto pelo Governo dos Açores).
Esta lição de
sapiência a Berta Cabral e aos seus seguidores foi cruel, tal como o outro lado
do palco, aquele que interessa aos Açorianos, é demasiado sério para que
alguém, com consciência, o possa ignorar. Nesta, como noutras matérias, a falta
de memória de alguns será, sempre, avivada pela verdade.
Publicado no Diário Insular e no Jornal do Pico